sábado, 4 de agosto de 2007

Factos sobre a OTA

O texto é de Luis Guimarães Lobato, professor do Instituto Superior Técnico, publicado na revista Ingenium n.º 99, se a OTA perde para a Margem Sul em todos os aspectos aqui apresentados, porque motivo se quer fazer o aeroporto na OTA?

Por volta do decénio de 1960, o Eng.º Victor Veres, então director geral da Aeronáutica Civil, verificou que a expansão dos transportes aéreos era muito superior à prevista. Nestas condições, o aeroporto da Portela teria dificuldade em acompanhar uma tal expansão por falta de espaço de reserva para a ampliação das instalações técnicas e complementares nos próximos decénios de exploração do actual aeroporto. Era, portanto, necessário encontrar nova localização para o novo aeroporto de Lisboa, tanto mais que ele poderia servir de plataforma de distribuição de tráfego aéreo intercontinental em relação à América, Brasil e países africanos. Aprovada esta proposta pelo então ministro das comunicações, Eng.º Carlos Ribeiro, este determinou que fossem ouvidas missões técnicas sobre aquela nova localização. Para este efeito, foram convidadas as missões que tinham sido responsáveis pela construção e localização dos novos aeroportos na Europa e EUA.
As missões em referência foram conclusivas em relação à exclusão da margem direita do Tejo para nela se instalar o novo aeroporto, pelas razões que a seguir serão indicadas. Do mesmo modo, foram unânimes em designar 14 localizações na margem Sul do Tejo. Na sequência dos relatórios das missões técnicas, o ministro Carlos Ribeiro criou o G.N.A.L. – Gabinete do Novo Aeroporto de Lisboa – para prosseguir a concretização da selecção da área do novo aeroporto de Lisboa. O estudo comparado das 14 localizações, agora tendo em conta a isócrona mais favorável da ligação a Lisboa, acabou por seleccionar a localização do Novo Aeroporto na área da margem Sul compreendida entre o Rio Frio e a margem esquerda do Tejo.
De facto, não era verdadeira a afirmação de que resultavam dois locais – Rio Frio e Ota – pelo menos enquanto existiu o G.N.A.L..
Em virtude de fortes pressões sobre a localização do novo aeroporto, o Ministro das Obras Públicas e Comunicações do governo de Marcelo Caetano, assim que subiu ao poder, extinguiu o G.N.A.L.. Depois do 25 de Abril aparece a Ota como o local referido para o novo aeroporto, contrariando a opinião unânime das missões técnicas já referidas, de não implantar o novo aeroporto na margem direita do Tejo.
Passemos agora, resumidamente, à enumeração das exigências e condicionamentos que presidiram à selecção pelas missões técnicas, da nova localização do novo aeroporto.
1. CAMPO DE VISÃO
O novo aeroporto deveria ter um campo de visão livre de 360º até à distância aconselhável da manobra dos aviões – aterragem e descolagem.
Margem Sul do Tejo
Qualquer localização nesta margem dispõe de campo de visão de 360º e permitiria a localização de pistas sem interferência de outros corredores aéreos.
Ota
Campo de visão restrito a 180º em virtude do paralelismo com a serra de Montemuro. Loca-lização condicionada das pistas no sentido Nor-te/Sul devido ao posicionamento em relação à serra de Montemuro. Corredores aéreos com interferência de outros corredores e a linha de indústrias da margem direita do Tejo.
2. METEOROLOGIA
O aeroporto exige a localização dependente de ventos largos e favoráveis aos movimentos dos aviões e condições gerais tanto quanto possível boas para movimentações aéreas.
Margem Sul do Tejo
Qualquer localização estudada pelas missões técnicas apresentou-se com boas condições meteorológicas.
Ota
As condições meteorológicas deste local são completamente adversas às movimentações aéreas, segundo conclusões das missões técnicas. Primeiro, em virtude das condições muito desfavoráveis dos ventos dominantes do quadrante norte, apresentando-se sempre lateralmente às pistas, não só com fortes rajadas como turbulências altamente inconvenientes. Segundo, a grande frequência de nevoeiros e brumas nos períodos da manhã e no fim do dia, provocadas pela proximidade do rio Tejo.
3. DISPONIBILIDADE DAS ÁREAS NECESSÁRIAS PARA AS INSTALAÇÕES TÉCNICAS E PARA A GRANDE GAMADE INSTALAÇÕES COMPLEMENTARESDE SERVIÇOS DIRECTOS E TODAA VARIEDADE DE APOIOS DESTINADOSAO FUNCIONAMENTO INTEGRADODO AEROPORTO
Margem Sul do Tejo
A grande planície a sul do Tejo permite estabelecer a área necessária para a instalação do aeroporto e sua futura expansão sem quaisquer limitações de terrenos disponíveis, tal como se concebe na concepção de um aeroporto nacional e destinado também a serviço internacional. A sua localização depende principalmente da melhor isócrona das comunicações e transportes com Lisboa e o resto do País. Como se disse e para satisfação dos condicionamentos enunciados, deveria dar-se preferência à área compreendida entre o Rio Frio e a margem Sul do Tejo.
Ota
Como foi dito, as missões técnicas em causa foram unânimes em excluir a margem direita para a legalização do novo aeroporto, tendo em conta a dificuldade de obtenção de áreas extensas e conformadas para uma devida localização.
4. CONSTRUÇÃO
Para construção do novo aeroporto é dada preferência à disponibilidade da larga área com movimentos de terra somente pequenos, facilitando, assim, a construção das pistas actuais e da expansão sobre terreno natural. Qualquer intercalação de troços de pista sobre aterros é altamente indesejável porquanto qualquer pequeno abatimento de aterros pode levar ao encerramento do aero-porto durante o tempo necessário para nova consolidação dos mesmos aterros.
Margem Sul do Tejo
As disponibilidades de superfícies livres de terreno natural para as instalações técnicas são totais. Haveria apenas pequenos movimentos de terras para regularização geral do terreno. A distribuição de carga dos impactos às pistas seria minimizada pelas próprias características para a sua construção. Deste modo, não haveria alteração geotécnica dos terrenos, não haveria alterações geotécnicas hidrológicas das superfícies, onde seriam construídas as instalações técnicas e complementares do novo aeroporto.
Ota
As instalações técnicas e complementares do novo aeroporto teriam de ser construídas sobre a criação de uma plataforma geral, construída acima do nível das cheias do Tejo. Isto criaria a necessidade de integrar numa unidade, terrenos naturais e aterros. Também para efeito de disponibilidade desta plataforma, seria necessário realizar grandes movimentos de terra, incluindo os de segurança dos movimentos dos aviões. A execução de aterros bem consolidados e à prova das infiltrações das cheias do Tejo seria um obstáculo difícil de vencer para garantir não haver abatimentos. Mais umas condições técnicas de exclusão da margem direita do Tejo para localizar o novo aeroporto.
5. ACESSOS AO NOVO AEROPORTO
Segundo as missões técnicas, os acessos ao aeroporto deveriam ser os múltiplos das redes nacionais e regionais, não só em relação a Lisboa, mas a todo o País. Assim, o novo aeroporto deveria ficar em relação a Lisboa, numa isócrona de 20 a 40 minutos por ligação directa a Lisboa. Para este efeito, o aero-porto seria integrado nas redes nacionais dos caminhos-de-ferro com ligações directas ao Norte e ao Sul. Também deveria dispor de ligações ferroviárias regionais, tipo metropolitano de ligação a Lisboa. Do mesmo modo, deveria ser reservado espaço para qualquer nova ligação ferroviária. As ligações rodoviárias a Lisboa e sua região e ao Norte e Sul do País deveriam ser integradas com liberdade de circulação nas redes nacionais e regionais.
Margem Sul do Tejo
A localização na margem Sul do Tejo permitiria, com toda a disponibilidade, as necessárias instalações de amplas gares ferroviárias e igualmente o estabelecimento de todas as modalidades de transporte ferroviá-rio. Deste modo, seria respeitada a localização com a isócrona desejada.
Ota
A dificuldade de obtenção de espaços livres seria grande para o estabelecimento das instalações dos transportes por forma a serem integrados na isócrona de 20 a 40 minutos, dada a estreiteza das áreas disponíveis entre a margem do Tejo e as fraldas da serra de Montemuro. Foi mais um parâmetro de exclusão, à qual se juntariam as dificuldades técnicas, por falta de espaço, para o estabelecimento das ligações directas a Lisboa.
6. PLANEAMENTO GLOBAL
Em virtude da experiência já havida, foi aconselhado prever logo à partida as áreas necessárias para o estabelecimento do novo aeroporto e de sua futura expansão, por forma a constituir uma unidade global aeroportuária e todos os seus apoios complementares. Em resumo, seriam consideradas as seguintes áreas especializadas integradas numa unidade de funcionamento lógico: a área mais importante em relação às restantes seria destinada a todas as instalações técnicas, entre outras, as pistas e sua expansão, a gare de passageiros, as instalações técnicas de comando dos movimentos aéreos, as plataformas para estacionamento de aviões de carga aérea, os hangares de revisão dos aviões, as oficinas de apoio aos aviões e aos serviços, a gare e mais instalações de apoio à plataforma de helicópteros, os depósitos de redes de abastecimento de combustíveis e mais todo o equipamento de apoio ao funcionamento do aeroporto, cais de movimentação por transporte terrestre de apoio à aerogare nas suas modalidades individuais, públicas e colectivas e parques de estacionamento a curto e longo prazo. Gare de ligações ferroviárias próprias do aeroporto e das linhas de passagem das redes nacionais.
Segunda área importante: a das implantações dos edifícios destinados a serviços e a instalações turísticas e comerciais.
Em virtude da experiência vivida e das exigências exponenciais verificadas, é necessário prever uma área importante destinada a instalações industriais, designadamente agro--industriais e de mecânica ligeiras e finas muito dependentes para a sua expansão do transporte aéreo imediato.
Finalmente, todo este conjunto de instalações deveria ser apoiado por uma unidade urbana de 15 a 20 mil habitantes destinada a todo o pessoal trabalhador do novo aeroporto.
Margem Sul do Tejo
A margem Sul do Tejo dispõe de áreas suficientes para a criação de uma unidade aero-portuária/urbana, desde que seja elaborado o plano de conjunto do novo aeroporto
Ota
Face às exigências do conglomerado técnico--urbano do novo aeroporto, foi mais um parâmetro de exclusão da margem direita por não serem aceitáveis afastamentos entre as diversas áreas específicas do conglomerado.
7. CONCLUSÃO
De acordo com as conclusões das missões técnicas então encarregadas dos estudos de localização do novo aeroporto, estas foram, no seu conjunto, completamente desfavoráveis à localização do novo aeroporto na margem direita do Tejo, até porque o impacto directo da movimentação aeroportuária seria altamente desconfortável para a população da faixa já muito urbanizada da margem Norte do Tejo. Teve-se também em conta o custo muito menor da construção do novo aeroporto na margem Sul do Tejo.

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