sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

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Concorrência posta em causa nos genéricos

2009-01-07

Os genéricos Almus entram este mês no mercado. São lançados por uma empresa maioritariamente participada pela Associação Nacional de Farmácias, que defende a prescrição pelo nome da substância activa.

A denominação comum internacional (DCI) é a designação da substância activa principal de um medicamento. É de referência obrigatória nas receitas sempre que se prescrevam genéricos, mas os médicos podem, ainda assim, acrescentar o nome do laboratório que produz esse genérico - e com uma cruz impedir que os farmacêuticos substituam o fármaco prescrito por um genérico semelhante. Um bloqueio que só é problemático quando há rupturas de stock, como aquelas que foram noticiadas recentemente, na sequência da redução de 30% no preço dos medicamentos sem marca.

As notícias, dizem fontes da indústria farmacêutica, escondem "interesses". Porque a ruptura é "residual". Facto que foi, de resto, confirmado pela Autoridade Nacional do Medicamento, segundo a qual houve registo de problemas em 30 dos cerca de 3500 genéricos existentes. A esmagadora maioria deles com alternativas (31, num caso). A dificuldade levantava-se quando uma cruz do médico impedia a troca - e conduziu à defesa da prescrição exclusiva por DCI, dando ao farmacêutico liberdade para dispensar qualquer fármaco.

Fontes contactadas pelo JN - que pediram o anonimato - remeteram a justificação das notícias para o interesse da própria ANF. E para a marca de genéricos que entra agora no mercado.

A Almus Lda nasceu há um ano, no seio da Alliance Healthcare, que é líder da distribuição de medicamentos em Portugal, com 24% do mercado. Ora, esta empresa, criada em 2005, é detida em 49% pela ANF e tem como presidente do conselho de administração o líder da Associação. Outros 2% dos capitais são da José de Mello Saúde, na qual a ANF participa com 30%. A ANF acaba por deter 51% da Almus. Em resumo, a ANF - que representa 97% das farmácias existentes em Portugal - é líder da distribuição de medicamentos e está, agora, ligada à produção de genéricos. Fontes do sector falam em "violação das regras de concorrência" e "verticalização do sector" - produção, distribuição e venda -, mas a associação rejeita as críticas. Diz que a Autoridade da Concorrência "não encontrou nenhum motivo de preocupação em relação a uma possível distorção da concorrência" com aquisição da Alliance Healthcare. E garante que "tem por missão a defesa dos interesses morais, profissionais e económicos dos proprietários de farmácia", que "são absolutamente independentes no que respeita às decisões de gestão comercial".

A ANF recusa assim que as farmácias dispensem fármacos da Almus só porque a marca é comercializada pela Associação que as representa. Ora, reage fonte da indústria, "foi assim que a Cinfa dominou o mercado de genéricos em Espanha. Começou por uma cooperativa de farmácias".

Contactada pelo JN, a Ordem dos Farmacêuticos também rejeitou a verticalização do sector com os negócios da ANF. "Não é uma holding, é uma associação. Se detivesse farmácias, aí, sim, haveria verticalização", considera João Mendonça, do Conselho Regional do Sul. Questionado sobre se a prescrição por DCI não colocará totalmente na mão do farmacêutico a decisão do fármaco a dispensar, o dirigente diz acreditar que a bola passará antes para "a mão do doente". "Provavelmente será ele que escolherá o mais barato, ou o que já conhece". Até porque, garante, "os genéricos mais vendidos são os mais baratos e não os que dão mais vantagens às farmácias".

Tal como a ANF, João Mendonça defende a prescrição por DCI, mas por uma "questão técnica": "Se são todos iguais, qual a razão para estar lá a marca?" A ANF, essa, encara a DCI como "um mecanismo fundamental de concorrência no sector do medicamento, com benefícios económicos significativos para os doentes e o Estado".

Notícia do Jornal de Notícias

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